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22 setembro 2006


E o que é um jequitibá na desordem das coisas?

Talvez fugindo um pouco à concepção aristotélica de como organizar as idéias - em início, meio e fim -, cheguemos a um resultado partindo por outro caminho, um pouco diverso é verdade, mas com um objetivo de narrativa experimental a ponto de desafiar não só esta tendência nas ciências, como também nossos próprios prismas de observação e reelaboração do apreendido e dele nossas representações.
Com o acirramento da implementação das políticas neoliberalizantes na maior parte dos países da América Latina e, principalmente no Brasil, um dos setores mais afetados e que já podemos notar com consciência de época, tal é sua perniciosidade, foi o campo da Educação como um todo.
O modelo implantado no Brasil tem pressupostos básicos ao seu funcionamento, onde as políticas públicas de caráter social são deixadas à parte, para dar lugar ao jogo de políticas que beneficiam os setores privados nacional e estrangeiro, adotando uma espécie de desobrigação do Estado de todas ações de caráter social, tendo como máxima, a política do "Estado Mínimo".
Neste sentido, a educação, tanto a pública quanto a privada, foi posta dentro dos mandamentos do modelo Neoliberal (para países pobres ou chamados bondosamente por cientistas alheios de "emergentes" ou industrializados).
Mesmo não havendo sido implantadas e levadas a cabo todas as propostas neoliberais, as conseqüências são desastrosas quando olhamos primeiro para o ensino superior, onde as universidades, faculdades, centros universitários, "fábricas de diploma", no âmbito privado, cresceram assustadoramente, a ponto de representarem, segundo dados do Ministério da Educação, 71% dos estudantes matriculados em nível superior, sem levar em consideração as pós-graduações. Aos 29% dos estudantes da rede pública (CEFET’s, universidades federais, estaduais e municipais) sobraram o descaso e a falta de investimento em ensino, pesquisa, extensão e capacitação do corpo docente, e ainda uma aceleração do processo privatizante, no tocante a cobrança de taxas e aumento de fundações de direito privado dentro das universidades públicas, principalmente nas áreas de maior interesse do mercado financeiro.
O resultado real do mencionado desastre, nos Ensinos Fundamental e Médio, perceber-se-á em alguns anos, quando de fato poderemos sentir os frutos advindos de tais políticas educacionais, onde se reafirmam cada vez mais um caráter apenas informativo e praticante de um individualismo sem medidas.
O fato de aumentarem as vagas das séries iniciais nas escolas públicas não representa a tão sonhada democratização do acesso à educação, uma vez que, acesso não significa necessariamente permanência e por conseguinte, permanência não é resultado de qualidade; se compararmos a quantidade de vagas criadas no ensino público com o aumento populacional nos anos de 1990 a 2001, perceberemos que a demanda por vagas foi maior, ou seja, o que se alardeia é que "...aumentamos as vagas na Escola Pública", mas após aumentarem as vagas do Ensino Fundamental, o mesmo não aconteceu ao Médio e Superior, e aí não fizeram mais do que acompanhar o crescimento vegetativo, mesmo levando em consideração as pessoas que se formaram nesse período, pois sempre a quantidade de ingresso na escola pública é maior que a de formatura.
É verdade que não há mesmo como negar o aumento de vagas na rede particular, tendo em vista que sobram vagas, mas apenas para os ricos, pois os preços cobrados são exorbitantes; neste sentido, em medida alguma houve democratização do acesso como dizia "pretender" o governo federal; o programa de financiamento para estudantes, o FIES, não atende a demanda, além de cobrar juros mais altos que dos produtores rurais; a inadimplência experimentou um aumento em demasia. O ensino privado foi mercantilizado, sobretudo a partir de 1990, a ponto de chegar a representar arrecadação próxima do que movimentam os setores de Energia e Telefonia juntos (mesmo depois da privatização desses setores), onde a educação é responsável por cerca de 9% do PIB (Produto Interno Bruto), ou seja, 90 bilhões de reais. Só para ter uma idéia da importância adquirida por este setor, após as políticas neoliberais o faturamento das instituições de ensino privado subiu de 3 bilhões em 1997 para 10 bilhões de reais em 2001, o que nos mostra como a educação privada virou um grande negócio. De posse desses dados, como acreditar que houve investimentos reais na Educação Pública? Se houve mesmo, como explicar este enorme crescimento no setor privado?
Como não há continuidade e sim uma progressiva diminuição planejada de investimento na educação pública por parte do governo federal, na universidade os cursos mais sucateados e de menor importância para o MEC dentre todos, são os de Licenciatura; e quando existem fundações de direito privado, essas estão justamente nas áreas mais rentosas para o mercado. Então, diante desse quadro de menor importância, sobretudo por haver um grande financiamento destinado para os empresários do setor privado – que também não usam tais empréstimos nas Licenciaturas – cresce em grande medida as empresas de plantio e reflorestamento, onde figuram e se destacam os Eucaliptos.
Com essa maldita lógica – a de debilitar e sucatear a estrutura e não investir nos cursos para formação de professores na Universidade Pública e, não investigar, não acompanhar e fiscalizar a qualidade da rede privada e ao mesmo tempo "aumentar as vagas, equipar com computadores..." as escolas dos Ensinos Fundamental e Médio da Rede Pública – não há como acreditar ser fácil que ainda nasçam Jequitibás em meio a isso tudo.
Mesmo dentro desse emaranhado planejado, além dos poucos jequitibás já frondosos e até mesmo quase em vias de passamento, ainda há os que estão por descobrir-se, não que não existam, só estão em período de dormência, como acontece a algumas sementes e, justamente por estarem em tamanha dormência é que podemos, tal como eles mesmos, despertá-los, descobri-los, arrancar-lhes seus invólucros ideológicos, onde poderão crescer e se perpetuar até o nascimento de outros.
Em boa hora, dentre esses eucaliptos plantados em série e crescidos enfileirados, domesticados, certinhos como o modelo idealizado pelos donos do capital, do tipo linha de produção em uma fábrica, haja também outras espécies de árvores que tal como acontece em reflorestamentos, sempre acabam surgindo antigas árvores, do próprio lugar ou até mesmo levadas – as sementes – pelo vento, pela chuva, roedores..., também é verdade, que talvez não existam muitos jequitibás, mas na desordem das coisas podemos ser um dos condutores de tais sementes ou mesmo e simplesmente um arrancador dos invólucros de dormência induzida. Talvez assim, quando formos perguntados sobre quem somos nós, respondamos realmente o que somos, uma pessoa; e não o que fazemos, não pela nossa profissão ou função.
Então, nessa desordem planejada, quase não vemos jequitibás, educadores no sentido mais nobre do termo, pois parece mesmo que desapareceram igualmente a algumas profissões do tempo de nossos avós; por ora, o que vemos são as enormes fileiras de professores, ou simplesmente meros repetidores de conhecimento, dadores de aula, como eucaliptos para alimentar fornalhas, caldeiras, churrasqueiras, fábricas de papel e por fim alimentar o maldito vício de acumular riquezas.

província da nação bororo.
poguba, 11 de setembro de 2002.

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nômade, de qualquer jeito e em qualquer tempo...

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