Panoramio - Lista de Fotos

03 junho 2008

entre penhascos e alagados



percepções contemporâneas sobre espaços ocupados no século 18 - império português de ultramar



O Mostrengo

O mostrengo que está no fim do mar
Na noite de breu ergueu-se a voar;
À roda da nau voou três vezes,
Voou três vezes a chiar,
E disse: "Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo,
Meus tectos negros do fim do mundo?"
E o homem do leme disse, tremendo:
"El-Rei D. João Segundo!"

"De quem são as velas onde me roço?
De quem as quilhas que vejo e ouço?"
Disse o mostrengo, e rodou três vezes,
Três vezes rodou imundo e grosso,


"Quem vem poder o que só eu posso,
Que moro onde nunca ninguém me visse
E escorro os medos do mar sem fundo?"
E o homem do leme tremeu, e disse:
"El-Rei D. João Segundo!

"Três vezes do leme as mãos ergueu,
Três vezes ao leme as reprendeu,
E disse no fim de tremer três vezes:
"Aqui ao leme sou mais do eu:
Sou um Povo que quer o mar que é teu;
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo,
Manda a vontade, que me ata ao leme,
De El-Rei D. João Segundo"

Fernando Pessoa


MALHAS QUE O IMPÉRIO TECE

Uti possidetis[1] somente para os branquinhos da Corte

dolorosa incumbência de prover cidade às margens das posses portuguesas de ultra-mar, determinada por D. João V, seguiu Dom Antônio Rolim de Moura com mapa do traçado da Vila desde Lisboa, a fim de encontrar local adequado, e houve por bem dele, fincá-la à margem direita[2] do rio Guaporé, em local plano e extenso o suficiente para grande demanda de crescimento, obedecendo ao cunho de Capital da recém-criada Província de Matto Grosso, da qual então seria, seu primeiro Governador.

Em que pese sua chegada a Cuiabá no dia 12 de janeiro de 1751, somente em dezembro do mesmo ano é queinício às atividades de reconhecimento e análise dos sítios instalados às margens do Guaporé, passando pelas povoações de São Francisco Xavier e Sant'Anna, descartadas por inconvenientes diversos, tais como clima "desfavorável", difícil acesso, insuficiência de água e também de matas que lhes fornecessem madeira para lenha e construção, pastos pobres e, quando também, o próprio relevo era eleito como motivo.

O fato é que havia necessidade de se firmar fronteira o quanto antes, pois "as minas do Mato Grosso e o Rio Guaporé passaram a assumir papel de interesse crucial para a Metrópole que se apressou em criar uma nova Capitania para administrar de perto os interesses da Coroa."[3], deixando clara a empresa de defesa da fronteira, onde "...construir uma cidade que plantasse definitivamente bases do domínio português sobre o novo território, articulasse o comércio entre a Metrópole e a nova área de produção aurífera, controlasse a hemorragia do contrabando do ouro das minas do Mato Grosso, assegurasse o controle da produção e a cobrança dos quintos"[4] era de extrema importância.

O local escolhido é Pouso Alegre, onde figurava antigo sítio de mineradores provindos das minas do Cuiabá,[5] estabelecido às margens do rio Guaporé em sua porção direita, por apresentar melhores condições a que Rolim de Moura se atinha, deixando expressas em carta a D. José I as justificativas de tal escolha, onde dizia ser este um bom lugar devido sua localização em relação ao rio, por haver um campo relativamente grande e plano, capões de mato, paragens próprias para fazendas de gado, proximidade com afluentes e também a possibilidade de se estabelecer roças; enfim, ao seu modo, era ali o melhor lugar para o estabelecimento da cidade, que, além de todos os fatores de provisão elencados, ainda e mais por isso, haviam as condições de defesa militar muito bem valorizadas e justificadas pelo Governador. Talvez por isso, tenha logrado empresa em campo alagadiço nas cheias do Guaporé. [...].


[1] O termo em questão nos reporta à política colonial portuguesa firmada principalmente com Espanha, que assegurava o direito de posse de determinada terra mediante sua utilização. Assim sendo, o termo significa "posse por utilização".

[2] Segundo Rondon, "A cidade de Matto-Grosso está situada aos 15º 0' 12'' de latitude e 16º 42' 58'', 80 de longitude occidental do Rio de Janeiro, na margem direita do Guaporé, cêrca de tres e meio kilometros abaixo da confluência do Alegre." Pág. 101.;

RONDON, Cândido Mariano da Silva. Índios do Brasil do Centro, Noroeste e Sul de Mato Grosso. Vol I. Rio de Janeiro: Conselho Nacional de Proteção aos Índios, Ministério da Agricultura, 1946. Ver também SILVA, Jovam Vilela da. Obra citada. Pág. 32 onde diz que "... à margem direita, Antônio Rolim de Moura, em 1752, fundou Vila Bela da Santíssima Trindade."

Segundo todos os mapas consultados e visita ao local, a cidade foi erguida de fato à margem direita do rio Guaporé, apesar de insistentemente ser posta à margem esquerda, como quer Maria de Lourdes Bandeira em seu livro Território Negro em Espaço BrancoEstudo Antropológico de Vila Bela. São Paulo: Brasilense/CNPq, 1988. pág. 85, onde diz que o "...Governador levou em conta as condições de defesa militar do sítio que escolheu. E esse último aspecto é que determinou a localização da vila à margem esquerda (destaque meu), mais baixa e alagadiça nas águas, em vez da margem direita, com os terrenos mais firmes e mais altos das fraldas da serra Ricardo Franco.". com efeito, deve-se apenas inverter a explicação de localização e de fatores determinantes para a margem direita, pois é natural determinar margem respeitando o curso do rio, em sentido à foz.

3 BANDEIRA, Maria de Lourdes. Obra citada. Pág. 83.

[4] BANDEIRA, Maria de Lourdes. Obra citada, pág. 83.

[5] SILVA, Jovam Vilela da em obra citada. Pág. 32 diz que "... desde o ano de 1732, os colonos residentes na região do Cuiabá haviam encontrado ouro nos rios Galera e Sararé, afluentes do rio Guaporé. A partir de 1736, muitos mineradores deslocaram-se do Cuiabá, para a região do Guaporé, conhecida como Mato Grosso.".



o cenário com relevo em 3D


localização da Cascata dos Namorados (Vila Bela)


vista parcial da Cascata dos Namorados (Vila Bela); destaque para formação rochosa arenítica em camadas de espessuras variadas.


vista parcial da Cascata dos Namorados (Vila Bela)


habitante natural da Cascata dos Namorados (Vila Bela)


líquen - habitante natural da Cascata dos Namorados (Vila Bela)


pinturas rupestres contemporâneas - Cascata dos Namorados (Vila Bela)


estrutura de proteção(?) sobre as ruínas da igreja matriz de Vila Bela da SS. Trindade - MT


poço d'água para fins domésticos, construído por trabalhadores escravizados com técnica de cantaria em pedra canga, na segunda metade do séc. 18 (sob administração portuguesa). (Vila Bela)


relevo em 3D, mostrando a localização de Chapada dos Guimarães


Igreja de Nossa Senhora de Sant'ana do Sacramento, em Chapada dos Guimarães - construída em 1778.


mureta circundante do pátio da Igreja de Nossa Senhora de Sant'ana do Sacramento, construída com blocos de pedra canga rejuntados com argamassa (cal, areia e estrume de gado)


reciclagem de material construtivo - a composição heterogênea expressa diferentes períodos históricos de confecção dos materiais (pedra canga ->séc 18 colonial, adobe -> séc. 19 e tijolo cozido em argamassa de cimento do tipo Portland -> séc. 20)


muro construído com blocos de pedra canga - séc. 18


típico pilão feito em tronco único, encontrado em áreas de trabalho escravizado afro-brasileiro em Mato Grosso.


fruto do cafeeiro -quintal de casa de moradores afro-descendentes


sede da Câmara Municipal de Chapada dos Guimarães - MT. nota-se a manutenção de estilo arquitetônico do período colonial reservado às estruturas de poder.





vista do mirante "Portão do Inferno"


vista de cima - mirante "Portão do Inferno" - Chapada dos Guimarães - MT


vista parcial do "Portão do Inferno"


vista parcial do "Portão do Inferno"


o que há de errado com esta foto? para além dos sinais de recente acidente de veículo contra a parede de arenito, não há sinalização nem acostamento...


sugestão de sinalização mínima necessária (simulada digitalmente)


vão muito grande na grade de proteção contra quedas, na borda do penhasco do mirante "Portão do Inferno"- Chapada dos Guimarães - MT.



simulação de queda de turista por negligência da administração do Parque Nacional de Chapada dos Guimarães. Nota-se que o vão da grade de proteção do penhasco é muito largo, admitindo queda até mesmo de adultos como no caso da situação sugerida aqui. Crianças teriam facilidade em escorregar por ali, com poucas chances de sobrevivência, dada a altura de quase 100 metros da borda do penhasco ao chão.


flagrante de negligência por parte da administração do Parque Nacional de Chapada dos Guimarães - MT. nota que a ferrugem já destruiu boa parte da grade de proteção contra quedas.

....
flagrante de negligência por parte da administração do Parque Nacional de Chapada dos Guimarães - MT. a imagem da direita apresenta simulação (em vermelho) de uma barra que deveria existir no local; faz destaque ainda para dois pontos de corrosão causada por ferrugem.



vista da borda do chapadão em que se acha a cidade de Chapada dos Guimarães - MT
desnível de mais 500 metros em relação à planície



vista da planície pantaneira a partir de mirante nas proximidades de Chapada dos Guimarães - MT


detalhe de formação rochosa e da vegetação de cerrado encontradas na borda do planalto de Chapada dos Guimarães - vista a partir do mirante.



vista da borda do planalto de Chapada dos Guimarães - MT



urutau - ave de hábitos noturnos - Cáceres - MT

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Um comentário:

heberton disse...

com certeza.. vou continuar apoiando a sua ideia!!

mas é uma pena que os pseudos intelectuais torça o nariz para o projeto do blog, como eu pude perceber na sexta-feira...
ja que para eles a Historia tem que ser feita as escondidas e sem muitas pessoas, os unicos que podem ter conhecimento para eles sao eles mesmos....
E como vc mesmo disse nos representamos os trabalhadores que nao tem opçao de cursar uma faculdade e seu projeto , para mim, proporcionará aos filhos desses trabalhadores tudo o que nós aprendemos no decorrer do ensino.
eu acho uma pena que em vez de apoiarem e se unirem ao projeto algumas pessoas o critique, pois com isso eu posso perceber que ha nisso um temor de tornarem a Historia acessivel a todas as pessoas. entretanto é o contrario, a disciplina estaria aberta a debates e criticas o que levaria a tão sonhada "nova historia" com a participaçao das pessoas que realmente estudam e sabem o valor q tem a nossa materia dentro da grade escolar.

pra mim a Historia nao é apenas mais uma disciplina que se aprende na escola e depois se esquece.... ela é uma disciplina que nos mostra quem nós realmente somos e como conseguimos chegar aqui, ela nos responde a todas as duvidas da infancia e da juventude e nada mais justo para nós que estudamos a Historia levar as pessoas que nao tiveram a mesma sorte que a nossa todo esse conhecimento...

nômade, de qualquer jeito e em qualquer tempo...

nômade, de qualquer jeito e em qualquer tempo...
"...eu sou assim, quem quiser gostar de mim, eu sou assim, meu mundo é hoje, não existe amanhã pra mim, eu sou assim, assim morrerei um dia, não levarei arrependimentos nem o peso da hipocrisia..." Paulinho da Viola